quarta-feira, 16 de julho de 2008

Criação de Museu Salazar divide esquerda e direita parlamentares

As bancadas parlamentares de esquerda e de direita ficaram hoje divididas quanto à criação do Museu Salazar, em Santa Comba Dão, Viseu. O debate foi feito a propósito de uma petição da União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), com mais de 16 mil assinaturas, que pedia a condenação da Assembleia da República ao projecto.

Na discussão da petição em plenário, a criação de um museu dedicado à figura de Oliveira Salazar, presidente do Conselho durante 48 anos, mereceu a forte oposição de PS, BE, PCP e de Os Verdes. Para o deputado José Junqueiro, a Câmara Municipal de Santa Comba Dão (PSD) “nada acrescentou ao concelho a não ser esta ideia de fazer uma ‘capelinha’ a Salazar”. O deputado acusou ainda a autarquia de dar uma remuneração vitalícia a um dos herdeiros do ex-governante como forma de viabilizar a iniciativa.

Pelo Bloco de Esquerda, Fernando Rosas não tem dúvidas de que “um museu com o nome do ditador instalado na sua terra” se presta “à exploração política pelos seus seguidores”, tornando-se “um santuário obsoleto de extrema-direita”. Fernando Rosas propôs antes uma lei que vincule o Estado à preservação da memória.

António Filipe, do PCP, autor do relatório final da petição, corroborou os termos do documento da URAP, ao lembrar que ao museu colide com a lei e com a constituição que proíbem organizações que mostrem “ pretender difundir valores, princípios” ou que “exaltem as personalidades mais representativas” de regimes fascistas.

“Não é com dois ou três objectos pessoais que pertenceram ao ditador que se constrói um centro de estudos” sobre Salazar, sublinhou António Filipe, apelando para que Governo e autarquias recusem qualquer apoio ao projecto.

A defesa da iniciativa da autarquia foi assumida pelo deputado José Cesário, do PSD. “Os portugueses têm o direito de aceder a todas as instituições e documentos que lhes permitam, sem paternalismos ideológicos, terem os seus próprios juízos críticos”, disse Cesário, considerando que a câmara pretende criar “um pólo de desenvolvimento regional”, “sem saudosismos de qualquer espécie”.

Num discurso que suscitou algum burburinho nas bancadas de esquerda não só pelo seu conteúdo como pela duração maior do que a permitida, Nuno Melo, do CDS-PP, defendeu que estar contra o Museu Salazar é opôr-se à própria democracia e ao Parlamento cujas paredes ostentam “simbologia do Estado Novo”. “A história não se apagam nem partes dela. É lembrança permanente sem cortes no tempo nem censura”, disse o deputado centrista.

Este argumento viria a ser contestado na intervenção seguinte, de Madeira Lopes, do grupo Os Verdes: “Nada mais falso. Ninguém queima livros ou os apaga. Antes pelo contrário: a memória é fundamental. Quem quer fazer um museu não está a preservar a memória, está a branqueá-la”.

O pedido essencial da petição – uma condenação da Assembleia da República ao museu e a tomada de medidas para impedir a sua concretização – não foi realizado, já que as petições não são votadas, mas tão só apreciadas.

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